domingo, 24 de agosto de 2008

Os erros não são só dele: da revista VEJA também

Fiquei indignada com os comentários maldosos, e preconceituosos apresentados nesta reportagem,onde colocam professores como uns 'incompetentes', passadistas ultrapassados e maus-caráteres por 'incutir ideologias anacrônicas e preconceitos esquerdistas nos alunos. Fico impressionada, pois só prova que os responsáveis por esta matéria, não aprenderam a importância de pensar e de buscar a cidadania. Faço questão de comentar esta reportagem e, por favor, comentem, concordem ou discordem das minhas críticas, pois precisamos demonstrar que aprendemos de fato o que é sermos cidadãos, sem nos enganarmos com a mídia, sem nos deixar fazer de bobos, sem nos fazer pensar que não pensamos e salve as diversas opiniões sobre as coisas.
Todos aqueles que acompanham o meu blog e minhas aulas sabem que sempre faço uso didático das melhores revistas em minhas aulas de produção de textos, mas nesta semana esta edição passou dos limites aceitáveis. Por esta razão, esta semana, vou usá-la em minhas aulas para mostrar seus erros e pré-conceitos. Veja publicou (20 de agosto de 2008) uma matéria, inacreditável sobre o ensino no Brasil. A matéria parecia querer discutir os problemas do ensino em função dos maus resultados de alunos brasileiros se comparados com outros no mundo afora (comparações sempre muito polêmicas), mas na realidade é uma crítica a suposta ideologização do ensino por professores e autores de livros didáticos. A reportagem concluiu que esse rendimento de nossos alunos é resultado de uma doutrinação comunista-esquerdista que temos em nossas escolas. Isso é um absurdo! É uma reportagem elitista, autoritária, agressiva, (pois não dá o direito de resposta).
O texto da reportagem começa com estas palavras: Vamos falar sem rodeios, (dando a entender que em outras reportagens elas usam esta técnica). Também utilizam uma linguagem irônica e contraditória. Inicialmente, dizem com enorme convicção, que não há conversas nos lares brasileiros sobre conteúdos desenvolvidos em sala de aula. Com isso, querem concluir a pouca importância da escola no cotidiano do aluno. Mas eu só queria entender uma coisa: de quais lares elas se referem? Os lares da elite? Ah é esqueci que só os ricos podem comprar estas revistas. Por isso só se dirigem aos ricos e a maioria da reportagem critica as escolas particulares e os livros e apostilas adotados por elas. Só para quem me lê saber, sou professora estadual.
Outro detalhe que faço questão de criticar é a imagem da capa, pois sabemos que não foi esta criança quem escreveu no quadro esta frase. Lá aparece uma criança, uma lousa e giz, ele está escrevendo com os pés bem esticados, pois parece não alcançar o quadro e escreve a última letra com as mãos bem esticadas, fica claro que não poderia ter começado a frase. Ainda poderia analisar a grossura da letra comparada ao giz. Totalmente disforme. (Está claro que foi uma montagem mal feita) PURA IRONIA. Daqui para frente preocupem-se, também com as imagens que vocês veiculam, pois nós, professores/leitores fazemos uma leitura delas também.
Outra constatação que faço: afirmam que a reportagem baseou-se em uma pesquisa encomendada pela própria revista VEJA à CNT/Sensus. Claro, que se encomendaram já tinham a tese pronta só queriam algumas pesquisas para que seus argumentos tivessem mais valor, mas sabemos que a intenção já existia antes de iniciarem a pesquisa. Fica evidente que a revista não divulga toda a pesquisa, mas apenas aquilo que é de seu interesse.
Veja quer destacar a influência nociva e ideológica de professores de geografia e história sobre a cabecinha dos indefesos alunos, dizendo que há uma doutrinação nessas aulas, através de posturas de caráter apenas ideológico e equivocado. Afinal, os professores influenciam ou não no comportamento dos alunos em seu cotidiano? Porque se somos um perigo a essas crianças e temos forte influência ideológica sobre elas, não as entendo não comentarem nada sobre as aulas com os pais.
A capa da revista faz ironicamente uma relação com a deficiência dos alunos com a escrita. Com isso, é fácil concluir, a revista não está disposta a discutir qualidade da educação e sim a ideologia de professores de geografia e história. Chega uma conclusão assustadora ao analisar a resposta de professores sobre a principal função deles em sala de aula. Para cerca de 70% dos professores, a principal função da escola é “formar cidadãos” (como fiquei feliz com essa resposta!). A resposta dos professores é absolutamente perfeita. “Formar cidadãos” é discutir conteúdos, é incentivar o raciocínio, é discutir valores, é despertar para seus direitos e deveres, é construir solidariedade, é preparar para o mercado de trabalho, é desenvolver uma visão crítica da sociedade, enfim, “formar cidadãos” senhoras jornalistas é formar seres humanos.
Quando mencionam as personalidades por que não perguntar aos alunos o que os professores falam de Hitler ou de Bush? Eu gostaria muito de saber como é ser neutro em relação a uma personalidade histórica... Mas o mais deprimente e injusto foi a referência totalmente errônea que fizeram a Paulo Freire. Será que elas estudaram pedagogia? Pedagogas, quem foi Paulo Freire? Paulo Freire foi um cidadão que lutou sua vida toda pela democracia (foi perseguido pela ditadura no Brasil) e pelas injustiças sociais, tinha uma visão humanista da educação. Publicou cerca de 40 livros sobre educação, grande parte, traduzidos em várias línguas, inclusive o hebraico. Foi convidado para ser professor visitante da Universidade de Harvard em 1969. Além disso, no início de sua carreira no magistério, foi um alfabetizador de adultos, e criou uma metodologia libertadora. Sobre criticas aos livros didáticos deixo para os referidos autores e professores de geografia e história a incumbência de provar que quase todos os comentários são de assuntos polêmicos, com opiniões que podem ser sim diferentes entre autores, professores, alunos, pais, jornalistas e tudo mais que possa pensar. Faltou mostrar a verdadeira intenção da reportagem. Nós professores sabemos das reais dificuldades que as escolas passam como: atualização dos professores, a deficiência da infra-estrutura escolar e os próprios erros de livros e apostilas, mas erros de conteúdo realmente, a permanência do aluno na escola, a quantia de aulas que os professores têm que pegar para ter uma vida digna, a constante troca de escolas que os professores passam até serem fixados. Tudo isto desgasta o magistério e estes sim, são assuntos que devem ser pautas de estudos não só de revistas, mas de toda sociedade que quer a qualidade de ensino seja resolvida no Brasil.