O uso da música erudita em filmes contribui para popularizar a música clássica? O que deveríamos dizer ao rei bávaro Ludwig II, se estivesse vivo, sobre a Disney ter copiado seu Neuschwanstein, feito por ele em honra às óperas de Richard Wagner, para fazer o lar da Cinderela? Fazer o quê?Depois da obra publicada não tem jeito. O criador, que até então era senhor absoluto, vê, indefeso, sua criação escapar-lhe por entre os dedos.Outro caso alemão, o mais célebre por sinal, é o da 9a Sinfonia de Beethoven. O gênio a compôs quando já estava completamente surdo e nem desconfiava sobre para quais fins ela seria usada. Pois em 1942 Josep Goebels, o ministro da propaganda de Hitler, escolheu a Nona como trilha sonora da superioridade ariana. Outra obra de Beethoven, a famosíssima 5a Sinfonia, é muito usada pelo cinema, pela publicidade e pelo teatro para dar um ar de suspense. A bela atriz Bo Derek correu como nenhuma outra pela praia no filme "Uma mulher nota 10" (Ten, 1979, EUA) ao som de "O Bolero" (1928) de Ravel. Outra obra que se tornou bastante conhecida por ter sido tema de um filme, neste caso o "Fantasma da Ópera" (The Phanton of the Opera,1925) com Lon Chaney e baseado na obra de Gaston Leroux , foi "Toccata e Fuga em D menor" do organista e compositor barroco Johann Sebastian Bach. Muito hilária é a cena do barbeiro judeu interpretado por Charles Chaplin barbeando um cliente no mesmo ritmo da Dança Húngara, n 5 de Brahms numa cena de "O Grande Ditador" (The Great Dictator, 1941, EUA).O caso mais interessante da popularização da música clássica é "Assim falou Zaratustra" (Also sprach Zarathustra, 1896) do compositor e maestro alemão Richard Strauss, inspirado numa obra homônima (escrita entre 1883 e 1885) de seu compatriota o filósofo Friedrich Nietzsche, a qual pondera as idéias do "eterno retorno" e da futura vitória do "super-homem" sobre a moral cristã. Esta música foi usada pelo diretor Stanley Kubrick como tema para"2001-Uma Odisséia no Espaço" . Nele também foi usado um trecho da valsa "Danúbio Azul" (1867) do compositor, violinista e maestro austríaco Johann Strauss, filho. Sem parentesco com Richard. "Assim falou Zaratustra", da mesma forma que a Nona Sinfonia, é amplamente usada só que em vez de o público associa-la ao seu compositor, como no caso de Beethoven, o filme de Kubrick é que vem às mentes das pessoas. Talvez seja por isso que o Banco Itaú, há algum tempo, usou-a como trilha sonora de um comercial de TV. O banco queria estar associado ao futuro. É interessante ver uma música erudita e já com mais de cem anos simbolizando hoje o futuro que ainda está por vir. A propósito, Stanley Kubrick também recorreu aos clássicos ao usar a 9a Sinfonia em seu filme "Laranja Mecânica" (A Clockwork Orange,1971, EUA). Há casos brasileiros; quem não se lembra do comercial dos desodorantes Vinólia usando sempre "A Primavera" (de "As Quatro Estações"), obra de Vivaldi. Mas o caso mais interessante, não para muitos ouvintes e os donos de emissoras de rádio, é a abertura (protofonia) da ópera "O Guarani" de Carlos Gomes. A história de Peri e Ceci do romance de José de Alencar é diariamente usada como prefixo pela Voz do Brasil. Pois é...aquela música que antecede o desligamento do rádio é um, se não o, maior sucesso da musica clássica brasileira em todo o mundo. A maioria das pessoas tendem a ver a música clássica como sendo elitista. Pois, criou-se o pensamento de que é preciso ser especialista para poder ouvi-la. E isso é terrível.Isso tudo é compreensível, afinal "clássico" vem do latim, classicus, e significa "de primeira classe". E tudo o que permanece pela qualidade, originalidade e universalidade. Com a passagem do tempo continuam agradando, surpreendendo, emocionando. Vivem retornando e sendo ajustados a novas realidades. Como disse o poeta romano Janus Vitalis (1485-c.1560) na sua célebre epigrama "De Roma" (Sobre Roma): "Disce hinc quid possit fortuna: immota labascunt,/ Et quae perpetuo sunt agitata manent", isto é, "Assim age a Fortuna: o que há de firme passa/ e o que sempre se move permanece".
Fonte: baseado no artigo de Adriano Medeiros Costa.
Cena Preciosa: