quarta-feira, 27 de fevereiro de 2008

EU


Versos Íntimos

Vês! Ninguém assistiu ao formidável

Enterro de tua última quimera.

Somente a Ingratidão - esta pantera -

Foi tua companheira inseparável!


Acostuma-te à lama que te espera!

O Homem, que, nesta terra miserável,

Mora entre feras, sente inevitável

Necessidade de também ser fera.


Toma um fósforo. Acende teu cigarro!

O beijo amigo é a véspera do escarro,

A mão que afaga é a mesma que apedreja.


Se a alguém causa inda pena a tua chaga,

Apedreja essa mão vil que te afaga,

Escarra nessa boca que te beija!

Por Augusto dos Anjos

Hoje eu trabalhei esta poesia no terceiro ano e os alunos ficaram impressionados com a linguagem e o pessimismo do poeta. Realmente, é o mais original dos poetas brasileiros, mas foi ignorado pela crítica do começo do século XX. Se alguma exceção se abriu, foi para caracterizá-lo de autor de versos estapafúrdios e aberrantes. Autor de um só livro publicado em vida. É certamente, o precursor da moderna poesia brasileira. Conta Francisco de Assis Barbosa, que em novembro de 1914, Orris Soares e Heitor Lima encontraram-se com Bilac e o informaram do prematuro falecimento de Augusto." E quem é esse Augusto?", perguntou Bilac. Um grande poeta, responderam-lhe, e Heitor Lima recitou o soneto "Versos a um Coveiro", Bilac sorriu superiormente e comentou:" Fez bem em morrer, não se perde grande coisa".


Bilac não viveu o bastante para perceber que se enganara.Na terceira edição de "EU", em 1928, venderam-se 5500 exemplares em dois meses, os primeiros 3000, em apenas 15 dias.

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