"Havia achado, sempre, que morrer de amor não era outra coisa além de uma licença poética. Naquela tarde, de regresso para casa outra vez, sem o gato e sem ela, comprovei que não apenas era possível, mas que eu mesmo, velho e sem ninguém, estava morrendo de amor. E também percebi que era válida a verdade contrária: não trocaria por nada neste mundo as delícias do meu desassossego. Havia perdido mais de quinze anos tratando de traduzir os cantos de Leopardi, e só naquela tarde os senti a fundo: Ai de mim, se for amor, como atormenta." (página 95)
Autor: Gabriel Garcia MárquezEditora: Record
Novo livro de Gabriel Garcia Márquez, é lançado pela Record, editora que o publica Brasil, com tradução de Eric Nepomuceno, jornalista que mais uma vez verte para o português brasileiro a obra do colombiano ganhador do Nobel de Literatura de 1982.
O livro não pode ser chamado de romance, seja porque é de fato um pequeno livro, com suas 128 páginas impressas com um corpo de letra bem grande, seja porque possui, se tanto, três personagens. É o narrador (um homem sem nome ou sobrenome), uma cafetina gorda e velha e uma menina jovem e virgem. É mais para um conto.
Rosa Cabarcas é a prostituta-mor que tem a missão de conseguir uma adolescente pura com quem o antigo-jornalista-aposentado-e-antiquado possa comemorar os seus 90 anos de vida numa noite de esbórnia. Como se vê, a história em si é bem simples, Rosa ora consegue a moçoila, ora não, e o cronista (ele escreve um texto dominical no jornal da cidade) faz visitas rotineiras ao puteiro da velha amiga para conferir de perto o “material”.
É curioso que o escritor colombiano tenha optado tratar um tema como este numa época em que o crime de pedofilia passa a ser denunciado e punido em todo o mundo, em todas as instâncias, da casa de família a empresas e à própria igreja.
Até onde se sabe, nenhum grupo de carolas ensandecidas ou de gente grilada com a sexualidade dos outros processou ou menosprezou o livro pelo fato de o personagem do livro querer, sem eufemismos ou “poesia”, deflorou uma criança.
Narrado em primeira pessoa, e muito bem escrito, com a maestria técnica a que só um escritor do gabarito e do talento de Gárcia Márquez consegue chegar, o personagem por vezes não consegue convencer aquele para quem fala de que é, sim, um senhor de 90 anos.
A impressão que se tem é que o homem pode ter 30, 49 ou 65 anos. Quando ele diz que vive “numa casa colonial na calçada de sol do parque de San Nicolkás, onde passei todos os dias da minha vida sem mulher nem fortuna...”, está bem, parece um ancião relembrando dias longínquos.
Quando um taxista conversa com o narrador, também, parece que aquele se dirige a este como a um senhor de bastante idade respeitável. Ou quando revê uma foto antiga tirada na redação do jornal em que trabalhou cotidianamente um dia e percebe que muitos dali já morreram.
Talvez falte ali uma dor, uma rabugice, uma dificuldade qualquer, algo mais característico da idade avançada, física ou psicologicamente. Nem resmungão, nem doente, nem casmurro, nem nada. É alguém falando, e poderia ser o próprio leitor a contar sua história, independente de quantos carnavais já pulara.
Trechos como “E me acostumei a despertar cada dia com uma dor diferente que ia mudando de lugar e forma, à medida que passavam os anos. Às vezes parecia ser uma garrotada da morte e no dia seguinte se esfumava” repõem as coisas no lugar. Mas são bem raros.
Por ser uma obra de curto fôlego e por ser muito bem escrita, lê-se Memórias de Minhas Putas Tristes de uma sentada, em uma ou duas horas.
É recompensador, ao fim do livro, perceber que o narrador vai ficando cada vez mais leve ao sentir que não vai morrer ao entrar no seu 91º ano de vida e que está disposto a viver com plenitude e sabor os seus cem anos de solidão (com uma putinha outra vez, de vem em quando, que ninguém é de lata).
Novo livro de Gabriel Garcia Márquez, é lançado pela Record, editora que o publica Brasil, com tradução de Eric Nepomuceno, jornalista que mais uma vez verte para o português brasileiro a obra do colombiano ganhador do Nobel de Literatura de 1982.
O livro não pode ser chamado de romance, seja porque é de fato um pequeno livro, com suas 128 páginas impressas com um corpo de letra bem grande, seja porque possui, se tanto, três personagens. É o narrador (um homem sem nome ou sobrenome), uma cafetina gorda e velha e uma menina jovem e virgem. É mais para um conto.
Rosa Cabarcas é a prostituta-mor que tem a missão de conseguir uma adolescente pura com quem o antigo-jornalista-aposentado-e-antiquado possa comemorar os seus 90 anos de vida numa noite de esbórnia. Como se vê, a história em si é bem simples, Rosa ora consegue a moçoila, ora não, e o cronista (ele escreve um texto dominical no jornal da cidade) faz visitas rotineiras ao puteiro da velha amiga para conferir de perto o “material”.
É curioso que o escritor colombiano tenha optado tratar um tema como este numa época em que o crime de pedofilia passa a ser denunciado e punido em todo o mundo, em todas as instâncias, da casa de família a empresas e à própria igreja.
Até onde se sabe, nenhum grupo de carolas ensandecidas ou de gente grilada com a sexualidade dos outros processou ou menosprezou o livro pelo fato de o personagem do livro querer, sem eufemismos ou “poesia”, deflorou uma criança.
Narrado em primeira pessoa, e muito bem escrito, com a maestria técnica a que só um escritor do gabarito e do talento de Gárcia Márquez consegue chegar, o personagem por vezes não consegue convencer aquele para quem fala de que é, sim, um senhor de 90 anos.
A impressão que se tem é que o homem pode ter 30, 49 ou 65 anos. Quando ele diz que vive “numa casa colonial na calçada de sol do parque de San Nicolkás, onde passei todos os dias da minha vida sem mulher nem fortuna...”, está bem, parece um ancião relembrando dias longínquos.
Quando um taxista conversa com o narrador, também, parece que aquele se dirige a este como a um senhor de bastante idade respeitável. Ou quando revê uma foto antiga tirada na redação do jornal em que trabalhou cotidianamente um dia e percebe que muitos dali já morreram.
Talvez falte ali uma dor, uma rabugice, uma dificuldade qualquer, algo mais característico da idade avançada, física ou psicologicamente. Nem resmungão, nem doente, nem casmurro, nem nada. É alguém falando, e poderia ser o próprio leitor a contar sua história, independente de quantos carnavais já pulara.
Trechos como “E me acostumei a despertar cada dia com uma dor diferente que ia mudando de lugar e forma, à medida que passavam os anos. Às vezes parecia ser uma garrotada da morte e no dia seguinte se esfumava” repõem as coisas no lugar. Mas são bem raros.
Por ser uma obra de curto fôlego e por ser muito bem escrita, lê-se Memórias de Minhas Putas Tristes de uma sentada, em uma ou duas horas.
É recompensador, ao fim do livro, perceber que o narrador vai ficando cada vez mais leve ao sentir que não vai morrer ao entrar no seu 91º ano de vida e que está disposto a viver com plenitude e sabor os seus cem anos de solidão (com uma putinha outra vez, de vem em quando, que ninguém é de lata).
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